quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Angústia

Este incômodo não tem nome:
Ele sobe, desce, rasga aperta.
Ele não tem nome e de nada prescinde - dura desde o gole de café, ao primeiro brinde.

Tem muitos dedos,
Tem muitos medos,
E eu o ganhei como um torcicolo, da noite pro dia, por puro desleixo.

Este incômodo não cabe, mas se expande e me estoura nas horas mais escuras.
Este incômodo são dunas movendo-se em meu peito.
Este incômodo não dorme, nem há jeito ou coisa que a si dome e eu o conheço bem.

Ele apenas nasce,
Cresce imenso,
Se reproduz,

E me come.


segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Baby, baby...

To Steven, my teenage dream.


Oh my! My dear baby
There's no way I can pretend
Baby, baby I think I've fallen
Down in love with you again
A big bright full moon was shinnin'
In the skies of Sunday night
Our memories comming back
Us two there, side by side
Then you sang that song again
And then again it was so deep
That I flew lighter and higher
'till the floor was off my feet
I'd been missing you for sure
But I see you're still the same
I still shiver, blush and adore
Everytime you spell F. I N.E.
The way your voice turned out in flame
In that song you sang again
Made me wanna hold you bad
Made me really wanna bang
The way your voice still pleases me, baby
My dear old-good-boyfriend
Made me such a great surprise,
Made me fall (live, in love) for you again.




quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Rio

Rio de Janeiro, selva sem rei
Onde do Atlântico emergem auroras
Rio que gerou, nutriu e amamentou
(com as tetas murchas da descrença)
Cada um dos meus sonhos.

Você, Rio. Ah... você!

Com seu modo escroto de dizer que gosta,
Com suas gentilezas transgressoras
E tantas rudezas instituídas.
Rio, mulher da vida, do vai-da-valsa, do rendez -vous.
Rio senhora muito boa, nos dois sentidos da palavra.
Filha de mãe escrava, de cujas costas garimpo versos
E que no mistério fundo deve manter imersos
Os segredos de quando ainda era aquela.
Rio que borda em seus morros favelas
Que pesponteia nas beiras palácios
E em todas as veias tem algo que excita
Da Barão da Torre à Barão de Mesquita.
Que inunda meus olhos de azul e a pele de lama
Dos talheres de ouro e latrinas imundas
Que fecha uma porta e abre horizontes
Da gente aos montes,da terra fecunda,
Por tudo aquilo que é só seu e meu,
Ou eu enlouqueço, ou morro de amores.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Uma Alegria

A amizade é uma alegria
- Igual a do amor -
mas menos grave.
Parece que difere na matéria-prima mesmo:

Mais te falo na cara e tudo certo.
Menos não vivo sem você.
E há uma coisa boa em sentir saudade.

A amizade tem um quê de irmandade
Mas é também outro lance,
De ser meio fã,
De ser meio afim do outro

Terna e eternamente.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Alaíde

Observei atenta cada passo, cada gesto da crooner enquanto ela adentrava, delicada, o minúsculo recinto. Buscando apoios para os pés e mãos, concentrada, meio aérea, mas de modo algum alheia aos que lhe aguardavam: alguns bons amigos e um ou outro visitante por si desconhecido,como eu. Observei atenta cada coisa de diva. Os olhos mareados, duas doses de whisky no camarim, vestido preto em veludo, bolero bordado com finas e brilhantes lantejoulas. Delineador, pouco batom e como único adorno uma ônix circular caindo sobre o colo ainda belo e cheio. Não sei se em seu colo carregou criança, se amamentou. A ônix como símbolo dela mesma: sua negritude, sua solidez, seu brilho eterno de pedra preciosa. Seus setenta e oito anos de Brasil.
Minha ansiedade em ouvi-la ali tão de perto desencadeou numa crise asmática e o ar que me faltava veio também dela quando abriu a boca e a plenos pulmões entoou Estrada Branca. O ar veio dela, de seu timbre rouco, porque tudo o que havia em sua voz era generosidade e entrega. Ela abriu a boca e cantou. Cantou sentido, como cantam os pássaros noturnos de saudade da mata, como cantam as crianças suas primeiras cantigas de roda. Ouvi atenta cada acorde da compositora, parceira do inigualável Vinícius de Moraes, um Vinícius tão amigo, assim, Amigo Amado, como tantos outros que se foram no passo do tempo, no andamento das horas da vida que se espalha e desdobra em canção. Da vida e do amor que se revelam em Tom Jobim antes mesmo de nascermos e se findam na voz torta e improvável de Alaíde, felizmente, antes que nós e a nossa coisa mais bonita, morramos.
Foi embriagador como estar hoje de volta a uma onírica década, quando havia charme, elegância e sinceridade na voz dos artistas. Quando lhes confiávamos nossa história de amor mais secreta, ainda que escancarada no palco. Quando havia verdade e generosidade. Tudo aquilo que se gerou e fez marear os olhos e o coração do compositor – haverá ainda? Mesmo que a duras penas, numa casa pequena, para um grupo de conhecidos que apenas sonham juntos, haverá ainda? Se meu coração inundou-se de amor e estou viva?
A canção responde sim. Alaíde responde, sim!
Resta a nós envelhecermos aos poucos, suficientemente devagar para podermos degustar a textura de nosso tempo, o doce e o amargo do que houver. E assim como a grande Alaíde Costa, estarmos aí pro que der e vier, porque a arte é isso mesmo, camaradinhas. Um baú misterioso de alegrias e tristezas, de descontinuidades feitas de apenas uma coisa chamada gente, nem boa nem má.
Gente que se doa e vira beleza.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Enxerimento

Você saiu há meia hora
Mas teu perfume não vai embora
Que mania mais enxerida

(esta que você tem)

De perfumar a minha vida!

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Terceira Lua

Para Anna e Anita, com carinho e gratidão.

Já vejo a terceira Lua
Crescer do sopé da porta
Tem três meses meu benzinho
Que cheguei nesta paragem

Nem bem eu pousei na rua
Qual fosse uma folha morta
Tu me deste teu carinho
E a prova de amizade

Nesta casa eu renasci
Encontrei o solo fértil
E do adubo floresci
Um oásis do deserto

Já é hora, a marcha canta
E eu devo ir-me embora
Agradeço, ó minha santa
Cada qual bendita hora

Já vejo a terceira Lua
Minguar cá nesta paragem
Tem três meses meu benzinho,
Que eu cheguei só de passagem.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Redondezas

Tenho usado caminhar à toa
Sem rumo certo, errante apenas
Em horas tão cedo que ninguém se move
Ou quando melindram as tardes amenas

Vou pisando as calçadas de pés doloridos
Tornozelos cansados, pesadas chinelas
E sorrio pros bichos nos cantos famintos,
São bem como as deles as minhas mazelas

As ruas me levam em sua correnteza
Mas eu não sou pau! Mas eu não sou folha!
Não há fio de ferro que me corte o sonho
Não há pé de vento que o afinco me tolha

Se vou escorrendo, boiando nas ruas
Pisando as calçadas com patas dormentes
É que desde o dia em que vi os teus olhos
Meu corpo padece de algum mal latente:

Eu vou caminhando e pressinto holofotes
A brisa se move e carrega os cabelos
Me sinto mais bela, mais viva e mais forte
A Deus e à Sorte confio segredos

Tenho usado (sempre) caminhar à toa
Mas desde que eu soube que tu vives perto,
Esquinas do meu coração têm mais graça
E nem me recordo viver num deserto.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Enquanto não Estiar

A cidade amanheceu branca. O vendaval da noite anterior somou-se ao calor abafado que mais pesava e apressava o final da semana. "Chega logo, sexta-feira". Na madrugada uivos de agonia chamaram raios e trovões. Esses lobos domésticos, pobrezinhos, sem nem sequer um campo para enlouquecerem-se em matilha. Como fizeram-se sonoros em seu desespero! Demorei muito a pegar no sono, preocupada com o sono que sentiria de manhã se não dormisse logo. E assim foi,evidentemente. Na manhãzinha meus olhos grudados acordaram sem coragem para uma cidade viscosa como a pele e o sangue dos paraibanos, cerenses,paulistas, gaúchos, mineiros - todos cariocas.
A cidade tão populosa tinha as calçadas vazias. Muitas foram as crises de enxaqueca, dor de barriga, febre alta, suspeita de dengue. Muitas, que coincidência. Que dor mais insuportável a de ter que ir trabalhar num dia destes.Impossível povoar as ruas cheias de corredeiras ferozes e vivas, que com intenção de vingança enchiam as calçadas do lixo podre resultante da vida humana na cidade. Praças, bancos, estabelecimentos vazios, a não ser por um ou outro retardatário da noite anterior, que sem perceber que o sol hoje não viera, acreditou que a madrugada simplesmente tinha esquecido de acabar, e ainda era tempo para outra dose. "Esfriou, me traga um conhaque".
As ruas assim, no abandono de um dia de chuva são demasiadamente melancólicas. Engoli o choro com um pensamento absurdo de que todos haviam sumido e só restava eu sob a água celestial dos tempos. Não acreditei no pensamento de fato, mas tive medo da força que teve. Que triste foi o meu lamento - "Eu gosto tanto de gente, cadê a população?" .
Mas uns olhares atrás de cortinas logo me fizeram recobrar a consciência. Estavam apenas todos em suas casas. Havia pessoas, elas só não rodavam por aí. No aconchego de seus lares quentes, com seus filhos e cafés quentes, chocavam o amor que iria às ruas em hora mais propícia, quando a própria Natureza não os contrariasse, quando o céu não desabasse assim tão raivoso. O céu das emoções de Deus. Permitindo-me ainda guardar o resto de sonho que havia nos olhos, transfigurei-me neste momento em rua, alameda, poste, jardim, poça imunda. Tornei-me eu mesma o corpo da cidade. E deparei-me no Largo do Machado com meu coração quietinho, fonte verde, musgulenta e inérte apesar da vida que abriga, apesar de imponente construção: Um coração cheio de amor por dentro, mas em cujas artérias não passeia nem sequer um glóbulo vermelho enquanto não estiar.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Luas como Esta

A minha alma tem cor cigana,
O meu telhado é feito de estrelas
Dos meus cabelos teço minha cama
De minhas pernas descem corredeiras

A minha alma tem fogueira acesa
E um violão que toca no sereno
Tem o ruído assustador da mata
E o olhar do moço mais moreno

A minha alma, esta aonde habito
Eu não limito, pois não tem tamanho
Quão mais eu penso que ela cala o grito
Tão mais me soa o grito a mim estranho!

E em luas cheias, luas como esta
A minha alma é festa, é força insana
A poesia: tudo o que me resta
É um antídoto ao coração em chama.

(Ou quem sabe a poesia a alma alisa, o peito inflama e pela lua, feito bicho clama?)



terça-feira, 9 de abril de 2013

Brindei Comigo

Brindei comigo um brinde antigo
Andava mesmo com saudade de mim!
De ter a sós com meu umbigo
Um bate-papo de botequim
E disse eu mesma: Como vamos?
E respondi, nem bem nem mal;
Pois já que agora aqui estamos

- E já que o papo é pessoal-

Deixa para lá os desenganos
Que eu nunca fui de baixo astral.

Que coisa boa ter comigo
Um lero-lero de botequim
Que começou com poesia
E terminou também assim

O céu estava uma beleza
E a minha mesa era só eu
Agradecendo a Natureza
Por todo bem que já me deu

Brindei comigo um brinde antigo:
Maior é Deus, eu sou pequena!
Estava mesmo com (uma baita) saudade
Na minha idade, que felicidade.





quarta-feira, 13 de março de 2013

Sem Poesia

Quero cantar mas não posso
Trago em mim uma focinheira
Meus ferimentos expostos
E um coração de espinheira.

Uns amores, uns remorsos
E uma canseira comprida
Que tornaram em destroços
Tantas certezas da vida

O meu sonho é uma cascata
Com queda em solo duro
É um pássaro que alçando as asas
Pára de encontro ao muro

Quero cantar, mas não posso
Ninguém mais liga pros poetas
E sem poesia, como acordar pro dia?
Como manter a espinha ereta?

quarta-feira, 6 de março de 2013

Intransitiva

Solidão, palavra líquida
Que nem palavra a si se basta
É tão vazia que quase fria
Tem tanto amor, que quase vaza.

Estar-se só, sem companhia
É mais que rude pleonasmo
Tamanha dor até sacia
Quando um é só, acompanhado

- Amar-te assim: um pirilampo na escuridão deixando rastro
Ou ver sumir no eco escuro o som das trovas que eu faço -

Pois solidão fosse ela verbo
Seria verbo intransitivo
Tem o sentido exato e certo
E leva o sujeito sempre consigo.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Naval

E quando eu na noite brado:
Seja você sempre forte!
É que no escuro do quarto
Temo demais a morte

Grito como quem desteme
Ao encarar a maré brava
Desvencilhar do leme
A sua própria sorte.

Se eu brado soluçando
Em frente ao populacho
Digo-lhes as coordenadas
Mas nunca a mim me acho!

A bombordo sonhos verdes
A estiva branca espuma
Sou apenas marinheiro
Que nas águas se perfuma

Nas marés infindas sumo
Nas ressacas me desmancho
Nas areias me espalho
Nas manhãs sussurro manso

E nos cardumes de anseios
Que rimam com despedida
Meu casco é partido ao meio
Antes mesmo da partida.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Chororô

Chorei de inchar os olhos,
De secar garganta, de jorrar o sangue
Chorei de lavar a alma,
De ter dó da gente, de rolar na lama
Chorei porque foi pecado,
E da maldade que fez o amor
Chorei choro de tristeza
E de saudade do que passou
Chorei por não haver jeito,
Só ver defeito em tudo o que fiz
Chorei, pois chora quem ama
Sem ser capaz de viver feliz
Chorei de mãos e pés atados
Peito amarrado na dor sem fim
Chorei de envelhecer a alma
Que um dia foi jovem dentro em mim
Chorei e foi tão grande meu pranto
Que nem me lembro por que começou
Mas a tristeza foi tomando conta
E quando eu vi, ela me derrubou
Chorei um choro de criança
E cada lágrima tinha razão
Ou se não tinha, virava uma lança
Que mais feria o meu coração
Eu chorei, chorei, eu confesso
E não queria mais chorar assim
Pois não sei se quando choro, despeço
Ou planto mais dor por dentro de mim
Se ao menos meu pranto regasse
Em meu peito um vasinho de flor
Mais belo seria o meu choro

(Seria um chorinho de amor,
Seria um choro perfumado
Um choro louvando o Senhor
E não este choro salgado
Este mar que meu pranto virou)

Mas foi só choro de tristeza
E toda a tristeza tem que se acabar
Que é de toda gente a natureza
Nunca querer sofrer ou se entregar
Em meus olhos inchados só resta
Deste tal chororô um ardor
E uma inspiração que atesta:
Sou poetisa das dores de amor
Mas faço poema se for de alegria,
Bem como por ela sei chorar também
Quem sabe chorar seja a fantasia
Da melancolia que me cai tão bem
Chorando eu me torno mais gente de carne
O corpo amolece, o espírito cresce
E toda armadura de mim se descola
Eu volto pra Deus e o pranto é prece
Quem nunca chorou não entende o que digo
Pois é meu amigo, chorei e foi isso
Eu não sei falar, é por isso que escrevo
Eu só sei chorar pelo tanto que vivo.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Terceiro Delírio - Os Tenores


Caminhava por um campo verde, mas não era grama. Tive a sensação de estar em Itaimbezinho, no Rio Grande do Sul, embora o clima não sugerisse o mesmo ponto geográfico. Pegava um pedaço de papelão como fazia nas brincadeiras de minha infância, e descia barranco abaixo de modo suave, como quem desce um tobogã, sem ferir-me ou levar susto. O rolimã improvisado estacionava a beira de uma água doce. Do meu lado esquerdo, vinha um canto suave em voz masculina. Tenores.
Carolina, você não entende nada de música. Mas eram tenores, estava certa, pela sensação que causavam nas papilas gustativas.
Mirei-me no pequeno riacho, muito limpo. Parecia água morna, pelo azul que tinha - um azul meio verde-água - pois no espelho que formava eu via refletido todo o verde claro das costas do cânion. Quando ia despir-me ao som daquela melodia natural, daquela melodia que parecia brotada do fundo das pedras e lavar-me no riacho, eis que a água se move. Olhei para os lados contrariada, estava sozinha ainda que observadora de mim mesma, eu e meu duplo, como veriam os Jurunas.
A água começou então a borbulhar. Isto é fenômeno comum nos cânions, Carolina. Mas deste borbulho agora é que brotava a melodia, o doce canto dos tenores. Era um bailado de bolhas, cada vez mais intenso e flutuante, algumas subiam por metros e estouravam em notas que se juntavam no ar em contacantos. E dançavam, e dançavam. Minha cabeça girava e o corpo já não estava bem ali. Não sabia se também eu voava, ou se era o corpo todo feito de música. Fui sendo levada sem perceber para cada vez mais perto da água. Carolina, você não sabe nadar. Mas era como se soubesse nadar, ou se dançar bastasse para flutuar e imergir sem perigo. Afundei, mas ainda ouvia música. Abri os olhos muito depois, já debaixo d’água e lá estavam os tenores, todos eles, com seus olhos de membranas, dentes afiados, e rabos de peixe.
Havia caído no canto dos sereios. Quando o ar me faltou, desfaleci no colo do mais moreno deles e veio aquele clarão.