segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

E quem não gosta?

Ah paixão, me deixa!
Vai pra longe de mim anjo alado!
Quanto mais se enrosca, mais se queixa
O meu coração sempre embriagado...

Ah quantos olhos, pernas, cabelos
Ah quantos cheiros, carinhos, risadas
Sendo o amor o maior dos apreços
Quantos tropeços, seguidas jornadas!

Se dentro de mim busco um canto isolado
De aconchego, onde eu seja sozinha
Ali também alguém me pede colo
E eu não sei negar quem acarinha...

Um amor pequeno, raro ou imenso
Um amor tenso, eterno ou manso
Qualquer grande amor, quando eu menos penso
Me leva o tormento e preenche meu canto!

Por isso sai de mim, me deixa!
Deixa eu seguir sozinha um instante
Pois quem mais gosta na falta se queixa,
Porque sem amor não se vai adiante.


segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Pra Curar Dodói.

Preza pelo tempo, estas horas difíceis. Tem a elas um bocado de atenção. Preza que depois isso passa, e a gente quase se esquece o que houve, porque a felicidade tem mais força que o sofrimento, porque é necessário ser mais forte aquilo que te levanta do que aquilo que te faz olhar de perto o chão chapiscado. Cuida bem direito, ama suas migalhas, menina. Embrulha-as com veludo e perfume. Que elas hão de ser preciosas, que hão de ser sua enxada na terra instável das emoções. Quando de ti o sangue for vertido, reserva-o num pote transparente pois o sangue não coagula, mas sim resta fresco e vermelho-escuro, resta cheio de todas as suas doenças e vitaminas. Depois rega com ele uma grama, devolve-o para a terra que ela se encarrega de fazer nascer dali uma família de vermes, um pé de hibisco, ou simplesmente o absorve e bebe, devolvendo aos rios e afluentes, que são obviamente feitos do mesmo sangue que você. Tudo isso é vida e é uma delícia.
Faz teus planos singelos ou mirabolantes e acredita neles porque é necessário crer: O galho mais alto, o seguro da areia. O destino sempre vai te mostrar que você estava errada e o quanto é capaz de te surpreender, pro bem e pro mal. Olha só para você, que coisa boa! Cheia de dentes, pernas, cabelos. Olha quanta voz ainda tem para perder, quanta tenacidade para doar ao corpo de homens ruins, quanta flexibilidade para doar ao corpo de homens bons. Por favor, confia em mim que já vivi mais e apenas segue teu caminho. Não há outra maneira, percebe? Apenas segue teu caminho e escolhe a alegria de viver, como sempre escolheu e sempre lhe caiu muito bem. Em teu coração e em tua memória ainda cabem muitos, muitos sentimentos... Uns que você ainda nem sabe que existem, veja só. Que delícia, você já está sorrindo! Sorri meu bem, sorri aberto e gostoso. Sorri e dá gargalhadas, canta um axé, escorrega na lama, toma um banho de chuva sem ficar envergonhada, dança no meio da multidão desconhecida. No meio de teus irmãos, tão desconhecidos, mortais e perecíveis quanto você. A vida, menina, é uma viagem em todos os sentidos. Mas isso a gente só é realmente capaz de entender o que quer dizer depois que um bom tempo passa. E eu sei que não vou te convencer. Mas você já sorriu e já me entendeu, porque tem o coração aberto e os ouvidos atentos.
Agora vou limpar teu dodói com cachaça mineira, segura na minha mão que vai arder, mas passa. Isso, pronto...Até que foi rápido, não foi? Está de parabéns. Agora já pode voltar a brincar.



terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Na hora do amor partido.

Lá se foi outra vez o amor, pegou seu barco fantasma e partiu bruma adentro sem velas, lento... Piano se foi, pianinho em choramingos de quem ficou de coração quebrado, sem olhos ou voz, de quem ficou tão só. É hora de regressar, sair deste cais nebuloso onde jazem todas as ilusões mais bonitas, os planos de vida, as crianças mortas inda no ventre de mulheres vivas. E porque vivas, mortas por dentro, quanto pior, por dentro o buraco ainda mais vazio agora.
Outra vez o amor partiu macio, deixando nas docas o arrepio gélido de uma paixão extinta. De um fogo que recém - deixou de arder. E no frio da ausência que ainda nem é saudade de tão recente, que ainda nem é tristeza de tão chocante, que ainda nem dói por falta de costume do sofrimento, restou incólume aquele coração sempre crente de que ou volta ele ou volta o amor, em novas figuras doces, cheio de carne e sangue, pelo outro lado da cidade onde não há porto, mas há quebra-mar, há revolto mar, o mar bravio das paixões sempre bem-vindas.
O passo, a rua, o continente. A caminhada até o lado oposto a embarcação. Nas costas antes da partida, um sopro úmido de resto de ondas, do branco sal que servirá de cobertura e curtume dos sentimentos. Há de mantê-los ainda degustáveis ao longo do tempo, embora seja necessário passar tempo para curar (nos dois sentidos da palavra).
Baixos olhos, para não ver o amor partir de vez. Mas pompa e prumo, é célebre o fim de um amor. É momento de grande realeza. É quando invertem-se os papéis da boca e dos olhos, que outrora sorridentes brilhos, agora calados inchaços. E segue o vivente rumo à terra, às cavernas rochosas, tudo aquilo que perdura intacto depois do amor partir. Segue o vivente, que seguir é mister, inda que meio morto ou pedaço. Inda que de pernas pesadas e passos doloridos por todo o bem que um amor faz e deixa de fazer. Navegam fantasmas num mesmo imenso oceano os barcos de todos os amores que não perduraram. Se esbarram por vezes, naufragam, lutam entre si - piratas! Repetem-se as personagens com novos atores. E repetem-se sempre as dores de amores, como pragas, algas prolíferas, barreiras de corais coloridos e perigosos de se transpor.
E segue o vivente rumo aos campos, os seguros campos mansos e floridos da solidão. Imensos campos onde se caminha ou se deita e descansa finalmente, eternamente. Onde descansa salgado o vivente, de tanto suor e de tanto (a)mar.