Há quanto tempo, ainda que ausente em corpo, acompanhas cada um de meus passos.
Sabes tudo de mim e por inúmeras vezes já narrastes minha vida, dìtastes o andamento de minhas paixões e das piores perdas, as mais tristes e foi sempre em tuas palavras de amor ou de adeus que eu encontrei alento. Até mesmo da morte já me salvastes em vida. Há quanto tempo, desde que para mim o mundo é mundo, eu penso em ti diariamente querendo ou sem querer. Pois era sua a canção que minha mãe cantava para embalar-me ao berço, e do mesmo modo eu embalei minha irmã mais nova e meus doze primos e um dia eu hei de embalar um filho meu. Eu te digo sim e te escolho, eu busco seu nome dentre tantos para alegrar meu dia, eu solto ao ar suas palavras, eu te roubo, eu te gasto, eu te escravizo quando me tocas profundamente e ali você permanece cantando ou contando causos, incessantemente, até que tuas palavras entrem em meu peito de forma que seja impossível tirá-las. Eu te apreendo... E deste modo já me causastes as emoções mais lindas e as mais feias e continuas.
Agradeço a Deus pela sua saúde e por sua inspiração infinita (este milagre que ocorreu num Rio de Janeiro de tantos mistérios). Agradeço diante da imensidão do tempo, das eras, dos séculos, por compartilhar uma época contigo, um país, uma cidade. Isso tudo já me bastaria, eu já viveria a te cantar por aí a plenos pulmões na certeza de que professava as palavras de um sabedor das coisas.
Mas ontem, meu mestre, você foi me aparecer. E virou gente, teve carne, osso e olhos para mim. Disse meu nome, me apontou, me tocou no ombro antes de ir embora com um gesto de carinho. E diante de ti, silêncio. Diante de ti, nenhuma palavra. As palavras são suas e meus os ouvidos, diante de ti alegria de aprendiz, porque falas apenas a língua sagrada dos poetas e dos passarinhos, és um bruxo, um monstro, mas acima disso és um homem simples e do bem.
Diante de ti meu mestre, boca para sorrir e mãos para aplaudir. Nem nos meus sonhos mais absurdos eu poderia imaginar um privilégio tão grande. Se minha jornada terminasse de repente e hoje eu partisse deste mundo, eu iria feliz, eu juro. Subiria aos céus dançando, embalada por um canto seu.
Na sua presença meu mestre, quanta gratidão!
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