domingo, 5 de junho de 2011

O mundo dos Homens.

E agora que já haviam reconhecido em seus corações aquela estrondosa verdade, agora que já havia uma mínima calma em sentir aquilo que antes perturbava e que então se apresentava à razão estranho e confuso, havia o resto do mundo. O mundo além deste universo mágico e recente, acolhedor. Havia de se respirar fundo e mergulhar no mundo dos homens.


Sentaram-se lado a lado no concerto, fazendo uma tímida manobra teatral combinada anteriormente no carro, estacionado dois quarteirões distante. Primeiro um depois o outro adentrariam por portas diferentes, cumprimentariam-se como se não se vissem há dias e só então escolheriam uma fileira no fundo da sala. Encontraram logo após uma pilastra que escurecia ainda mais os assentos, e sentaram-se lado a lado. Que alegria sairem juntos para ouvir música da melhor qualidade. Havia mesmo certo frisson em manter este segredo, havia algo de sensual que acelerava os corações e fazia com que a música, forte como veio, os embalasse numa aventura sem par: enganavam a todos, menos aos próprios corações. Sorrateiramente, um às vezes encostava no outro o sapato ou o joelho, de lado como se estivessem comprimidos por tantas pessoas em volta e nem percebessem que haviam se tocado, mas por mais que assim se portassem para fora, nos corações este mínimo toque fazia folia, explodia em cores, aquecia.
Ao espreguiçar-se, o primeiro esbarrou no segundo um braço que esticou-se em mão numa carícia quase imperceptível. Ao inebriar-se com perfeitas harmonias, o segundo sorriu ao primeiro de canto, e foi como se lhe desse um beijo.
Mas depois voltavam a sua expressão de camaradagem e interesse pelo show, as mãos frias e os corações quentes, o exercício da dissimulação.
Era tão grande e tão belo este amor, mas como era mister ser velado! Porque impossível e indesejado a olhos ruins de maldade, havia de se manter um segredo, era demasiado impuro aquele lindo amor perante o mundo dos homens e do preconceito.

Eu derrubei-lhes os olhos sem querer e me comovi com seus gestos de ansiedade e medo, mas de cumplicidade e amor. Não os vi partir, mas tenho certeza de que foram juntos, para desafogarem-se de tal realidade e serem plenamente felizes novamente ao retornarem ao seu mundo de afeto.

Eu vi dois homens e dois mundos, para dois corações partidos.

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