quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Um beijo, de tua curuminha.

Feliz aniversário, meu amor. Quisera eu te dizer quanta saudade sinto, destes dias em que ainda tua menina, te acordaria com uma flor rosada de nosso jardim, e te daria mil beijos dizendo que és a melhor do mundo e a que eu sempre quis. Sempre celebramos no teu aniversário além de tuas primaveras, o início da primavera brasileira de todo ano e por isso sempre teimei que a estação mudava no dia 21 e não no dia seguinte, quando oficialmente é apontada nas folhinhas de calendário.
Se sempre me soubeste teimosa, por quê me me deixaste desde tão cedo fazer tudo aquilo que me vinha à telha? Por quê me deixaste te abandonar tão cedo, me desvencilhar de ti, sair arrogante de salto alto e maquiada, dentro de teu vestido? Por quê me deixaste ir e me cantaste ainda menina que fui feita para o mundo e não para ti?
Por quê quando me pariste menina - tu e eu - enterraste meu umbigo ao pé da roseira mais bonita da fazenda, para que eu crescesse poeta? E por quê mais tarde, inda nos meus primeiros meses de existência quando eu sufocava por um edema de glote, arrancaste com as mãos o pé de dama-da-noite que causou minha quase-morte? Por quê não me deixaste partir de todo antes que eu me apartasse de ti?
Por quê me embalaste ao som do Chico Buarque, tornando-me assim para sempre a Noiva da Cidade, transparente e distraída, ladra do sono teu e do de outra gente?
Por tudo isso não te perdôo e não haverás jamais de me perdoar. Pelo que fizemos de nossas vidas, desde que nos separamos. São tantos os anos levados pelas estradas que jamais quisesse que eu tomasse, mas ainda assim me deixaste. Por amor e por ódio, por raiva de meu temperamento ao mesmo tempo tão parecido e diverso do teu. Por amor e ódio nos batemos, uma única vez, lembra? Me bateste na face e eu com petulância lhe ofereci a outra. Assim te apunhalei, e me apunhalaste, mas sempre pela face e não pelas costas.
Como é vingativo este amor, como é imenso. Como acordei hoje pensando em tua primavera e na vontade de tornar a ser aquela pequena que imaginaria te acordar aos beijos, quando na verdade muito antes, ainda de madrugada, já terias acordado e estado em meu quarto para ver se eu estava coberta e rezaria por mim pensando que era a minha existência teu maior presente de aniversário.
Não nos enganamos, nem tu nem eu.
No dia de sua primavera, meu amor, me perdôa. Ao menos hoje quando as flores nascem, ajuda a brotar em teu peito donde brotava o leite, o perdão por eu ter tantas vezes estragado teus planos, arrasado teus dias, desfeito tuas promessas e as minhas. Ao menos hoje, deixa eu voltar no tempo e te dar um beijo em flor, ainda que esta flor seja uma maria-sem-vergonha, ou como a gente costumava chamar as kalanchoes, uma maria-chiquinha. Eu queria te dar a orquídea mais rara e branca, que ainda não possuis. Eu queria te dar tudo aquilo que plantastes para mim e não vingou. Eu queria voltar ao teu ventre e renascer contigo uma nova filha e uma nova mãe. Quem sabe duas melhores. Quem sabe eu nascessse menino, ou talvez você não enterrasse meu umbigo ao pé de uma roseira e sim numa cova rasa, com desleixo. Quem sabe eu não levasse comigo sua inocência, e não te abandonasse. Mas isso são mistérios, são devaneios ansiosos, são invernos. Hoje é tua primavera, meu amor. Hoje todas as flores chegaram com a natureza que tanto amas, só para enfeitar a tua existência.Eu te encomendei uma primavera. E se eu pudesse, ainda que fosse só por hoje, eu te faria muito feliz.

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