quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Primeiros Delírios

Caro leitor do Tabuleiro de Iaiá,

Após três anos e meio de blog, decidi ousar um novo formato de escrita, para testar-me e variar um pouco, que nunca é demais. Publicarei a partir de hoje uma série que nomeei "Primeiros Delírios", que contará com alguns capítulos, ainda não sei quantos. Pretendo publicar semanalmente um "capítulo" . Abaixo segue a Febre desatadora de todos eles. Tomara que goste.
Um beijo,
Iaiá.





FEBRE

Da definitiva vez que adoeci de amor, tive a sensação de desfalecer, porque foi como se o corpo já não pudesse suportar-se encarnado, tamanho o peso e o cansaço arrastados ao longo das paixões que a vida trouxe volta e meia. Só ficou uma dor. Começava atrás dos pulmões, escorria pro baixo das costas e descia às pernas, imobilizando-me como deve ter imobilizado aquele camarada que eu encontrei outro dia, amputado de um pé: o peso foi demais para poder continuar a caminhada... Impressionou-me tanto.
Adoeci mas foi aos poucos, hoje me recordo durante as febres. No primeiro dia uma euforia, no segundo uma decepção, no terceiro dia tristeza, no quarto dúvida, no quinto solidão, no sexto dia abri os olhos sem poder mover-me. A noite havia trazido sonhos insanos, coloridos e agitados, corpos ao sol, mar revolto, sangue. Muito sangue. Minha cidade natal antes feita de morros e rios, agora me vinha cheia de praias e conchas de outras paragens. Tive a sensação de abrir os olhos, mas esperava estática no leito o grito do relógio para que me despertasse de vez daquele estado catatônico. Não conseguia calcular se era uma quinta ou sexta-feira. Não me levanto cedo às quintas-feiras e se fosse o caso e o relógio não despertasse, talvez permanecesse ali para todo o sempre e daí então seria sim: a morte, o sumir-se-do-mundo, o esquecimento.
Tentava forçar-me a piscar os olhos já abertos, porém imóveis e com a vista embaçada. Que cansaço, meu Deus. O tempo urge e eu tenho que sair para trabalhar. Que cansaço. Lembrava-me da música do Gil para Luzia. “Estou tão cansado, mas disse que ia...” e os olhos abertos alternavam-se entre a secura e a doce miragem da figura do meu amado, do sorriso dele. Estaria ainda ao meu lado? Não sabia quanto tempo tinha passado. Impossível virar-me. Talvez conseguisse chamá-lo. Eterno amor! Venha e me desperte com teu beijo de príncipe moribundo! Esbocei um grunhido, não havia voz. Havia apenas uma força desesperadora de dentro para fora, impedida de passar como uma chicotada de vento quando atinge uma triste janela fechada, como rio vivo e corrente que se estabaca numa impassível barragem de concreto.
Juntei todas estas forças para tentar respirar fundo. Quase não tive sucesso, mas senti mover meu peito levemente para cima, e só então me convenci de que definitivamente não tinha morrido. Assim que o ar que entrou, correu-me uma fisgada do cóccix até a base da cabeça. E veio aquele cheiro de cama, suor e saliva. Veio aquele cheiro azedo que me deu um calor muito forte no coração. Daquele arrepio brotaram lágrimas na nascente dos olhos, e eu como quem se afogava até que no segundo fatal consegue beijar o ar, engasguei, tossi e chorei. As gotas caiam quentes em minha pele gelada de semi-morta. Escorriam pelo canto de minha boca, com o gosto do sal da pele dele e eu bebia daquele veneno, resignada, e chorava como quem perde as pernas, chorava como quem se arrepende tarde, como quem fica, chorava como quem nunca.
Aquele pranto triste e desesperado me acolhia e compadecia, me libertava pra dentro. Carolina, você se revelou. O pranto fez do meu leito o ventre fértil de minha mãe, o colo de minhas avós. E eu me misturei a todas as histórias de amor de minha linhagem ancestral. Doía na carne, era preciso medicar-me. Ou isso, ou começar tudo do começo outra vez: Daquele momento chave em que a desilusão se planta do coração dos amantes para crescer seus ramos daninhos.
Quem saberia dizer? Eu dali apenas tentava retomar os sentidos. Na melhor das hipóteses seria possível apagar esta manhã da inconsciência e recomeçar.
Nos primeiros delírios tudo é possível.

domingo, 25 de novembro de 2012

Aparição

Mordeu mais que beijou, com fome e liberdade
Sorriu, espreguiçou e me mostrou que sou covarde
Falou amenidades, sem querer sequer saber
O que seria feito do meu peito ao amanhecer

Estava mais bonito do que era antigamente
E foi me aparecer em hora boa – naturalmente.
A marca que deixou cheirou a amor e saudade
Dos tempos que vivemos de paixão nesta cidade

Chegou e saiu dizendo que quem sabe outra hora
Antes de ir para sempre embora, outra vez me revisse
Deixei-lhe ir sabendo que era a ultima da história
Mas gosto tanto dele que nem assim fiquei triste

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Que te Deu?

Por que você anda chorando?
Amor, o que foi que te deu?
Confesso, nos últimos anos
Nenhuma notícia mais me entristeceu.

Você sempre teve aquele braço firme
Um novo sorriso pro que a vida traz
E foi esta fé que me deu a guarida
A força precisa para seguir em paz

Há dias eu soube que te encontraram
Tristonho sem ter aparente razão
Será que fugiram de ti os teus sonhos,
Será que te fere uma nova paixão?

Tomara não tenha perdido a esperança
Que desde criança costumava ter
Disseram que o teu lindo olhar anda triste
E que se eu visse ia querer morrer.