Lá se foi outra vez o amor, pegou seu barco fantasma e partiu bruma adentro sem velas, lento... Piano se foi, pianinho em choramingos de quem ficou de coração quebrado, sem olhos ou voz, de quem ficou tão só. É hora de regressar, sair deste cais nebuloso onde jazem todas as ilusões mais bonitas, os planos de vida, as crianças mortas inda no ventre de mulheres vivas. E porque vivas, mortas por dentro, quanto pior, por dentro o buraco ainda mais vazio agora.
Outra vez o amor partiu macio, deixando nas docas o arrepio gélido de uma paixão extinta. De um fogo que recém - deixou de arder. E no frio da ausência que ainda nem é saudade de tão recente, que ainda nem é tristeza de tão chocante, que ainda nem dói por falta de costume do sofrimento, restou incólume aquele coração sempre crente de que ou volta ele ou volta o amor, em novas figuras doces, cheio de carne e sangue, pelo outro lado da cidade onde não há porto, mas há quebra-mar, há revolto mar, o mar bravio das paixões sempre bem-vindas.
O passo, a rua, o continente. A caminhada até o lado oposto a embarcação. Nas costas antes da partida, um sopro úmido de resto de ondas, do branco sal que servirá de cobertura e curtume dos sentimentos. Há de mantê-los ainda degustáveis ao longo do tempo, embora seja necessário passar tempo para curar (nos dois sentidos da palavra).
Baixos olhos, para não ver o amor partir de vez. Mas pompa e prumo, é célebre o fim de um amor. É momento de grande realeza. É quando invertem-se os papéis da boca e dos olhos, que outrora sorridentes brilhos, agora calados inchaços. E segue o vivente rumo à terra, às cavernas rochosas, tudo aquilo que perdura intacto depois do amor partir. Segue o vivente, que seguir é mister, inda que meio morto ou pedaço. Inda que de pernas pesadas e passos doloridos por todo o bem que um amor faz e deixa de fazer. Navegam fantasmas num mesmo imenso oceano os barcos de todos os amores que não perduraram. Se esbarram por vezes, naufragam, lutam entre si - piratas! Repetem-se as personagens com novos atores. E repetem-se sempre as dores de amores, como pragas, algas prolíferas, barreiras de corais coloridos e perigosos de se transpor.
E segue o vivente rumo aos campos, os seguros campos mansos e floridos da solidão. Imensos campos onde se caminha ou se deita e descansa finalmente, eternamente. Onde descansa salgado o vivente, de tanto suor e de tanto (a)mar.
Filha, só não perca o amor por voce mesma, nunca! Aprenda a lição q. toda dor trás como a ostra nascendo da pérola machucada. Leva tempo, eu sei, mas ocupe o vazio pela única coisa q. o pode preencher: o prazer; q. v. encontra tão abundantemente nas suas manifestações artísticas.. Belas pérolas, minha flor!
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